Crónicas de Gestão | PRENDA DE NATAL

Vítor Hugo Ferreira
Diretor Executivo da D. Dinis Business School

Neste Natal o meu sonho era ter um Banco. Um tipo de Banco especial, que distribuiria lucros como rebuçados numa escola, que se ergueria altivo em crescimento, concedendo crédito a particulares sem garantias, a empresas sem projeto e aos acionistas dependentes (aconselho o leitor a uma pesquisa sobre a distribuição de lucros, pré-crise, na Banca e no Psi-20). Neste Natal o meu sonho era também ter um país, um país especial, com autoestradas para lado nenhum, com pavilhões no meio do nada e estudos sem fim para provar porque esse nada era tudo. Quando este Banco e este país precisassem de dinheiro, eles não iriam falir, porque a culpa era do leitor, que se comportou de forma irresponsável, ou das empresas realmente competitivas que tentam sair deste “sonho” ou dos jovens que não querem ser empreendedores e, por isso, fogem para outros países, ou dos desempregados e funcionários que são um encargo para este sistema.

Na verdade, este Natal recebi (recebemos) de facto mais um Banco, algo que é tão ridículo como óbvio e mais um sinal da total irresponsabilidade e falta de rigor do Governo anterior e do próprio Banco de Portugal (quem não antecipava há mais de um ano este desfecho? E o que foi feito até aqui?). Esta prenda poderá custar quase 3 mil milhões aos contribuintes, que mais uma vez terão de pagar por decisões erradas de gestores e políticos (europeus e portugueses) – não esqueçamos que as responsabilidades das autoridades nacionais terão de ser partilhadas com a Troika que, até 2014, esteve a vigiar a sustentabilidade do sistema financeiro e nada disse sobre o tema e com a Direcção-Geral europeia da concorrência (que defendeu desde sempre a liquidação do banco), mas que permitiu que o Banif estivesse durante um ano em situação de incumprimento (Troika e Comissão que são igualmente tão culpadas desta situação como das más soluções de política económica aplicadas a Portugal, como foi esta semana evidenciado pelo FMI).

Esta é a nossa prenda, que nos faz refletir sobre o país e a Europa que temos, que o irá obrigar a mais sacrifícios (e haverão sempre arautos da moralidade económica a dizer que tinha de ser). Talvez seja tempo para mudarmos este país… esse é o meu verdadeiro sonho de Natal.

 

Crónica publicada na edição de 24 de dezembro de 2015 do Jornal de Leiria.