Crónicas de Gestão | Colapso Internacional

“Nunca discutas com um idiota. Ele arrasta-te até ao nível dele e depois vence-te em experiência”. Esta famosa frase de Mark Twain pode ser aplicada à recente deriva protecionista dos EUA em matéria de comércio internacional. À partida, o leitor incauto poderá pensar que tarifas serão algo “bom”, uma arma económico-legal que cada país tem para se proteger de países “predadores” com exportações mais competitivas. Na verdade, as tarifas causam distorções de mercado, com consequências negativas para todos os envolvidos. No caso dos EUA isso é evidente porque ao se imporem tarifas em produtos, matérias-primas e máquinas, os consumidores norte-americanos pagarão preços mais altos. Poder-se-ia argumentar que isto levaria a efeitos de substituição de importações, mas a verdade é que outros países, com tarifas menores, ocuparão o lugar dos produtos tarifados, impedindo de igual modo o sector nacional de florescer (o que cria uma ineficiência). A única forma de fomentar substituição de importações seria aplicar tarifas a todas os países menos eficientes, mas no final o país termina com produtos mais caros do que os existentes globalmente, com um custo para o bem-estar dos seus consumidores. Este raciocínio não inclui ainda possibilidade de retaliação de subida de tarifas (uma guerra comercial), que impedirá que os nossos produtos/serviços, onde somos de facto eficientes e geramos valor acrescentado, entrem nos países terceiros (gerando consequências duplamente negativas para empresas e consumidores nacionais). No caso do EUA, o 2º maior exportador do mundo, significaria que software, filmes, carros, computadores, instrumentos médicos, etc., não poderiam entrar noutros países. Para além disso, toda a questão de como cada país pode gerar valor dentro da mesma cadeia industrial de um produto pode sofrer com guerras comerciais. Veja-se o caso de uma “Barbie” que, ao ser importada de uma fábrica chinesa, pode entrar nos EUA a 1 ou 2 dólares, mas que vai ser vendida a 15-20$. Isto significa que o valor criado pelo retalho, pelo marketing, pelo design e pela propriedade intelectual é bem superior (o que, por sua vez, nos relembra porque Obama quis centrar os Tratados TransPacífico/Atlântico, que Trump abandonou, em torno da propriedade intelectual). Obviamente, que as tarifas poderão ser importantes quando países fazem dumping social e ambiental ou não respeitam as regras da OMC, mas uma guerra cega e idiota (como são quase todas) levará a um mundo mais pobre e distorcido.

Crónica publicada no Jornal de Leiria