Crónicas de Gestão | A tripla hélice

Foi há cerca de 17 anos, enquanto fazia o mestrado cujo nome demasiadamente pomposo deixava esconder a sua importância para as políticas económicas e para a vida real, que pela primeira vez ouvi falar do conceito de tripla hélice. O Mestrado de Economia e Gestão de Ciência, Tecnologia e Inovação do ISEG, onde professores como Manuel Mira Godinho (um dos maiores investigadores de inovação nacionais), Bento Caraça (uns dos mais eminentes cientistas portugueses), Manuel Laranja (o pai da inovação industrial em Portugal) e até Manuel Heitor (atual Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) ensinavam como tudo aquilo que havia aprendido durante 5 anos de Licenciatura em Economia não estava inteiramente correto. Afinal, capital e trabalho não eram a chave, mas sim conceitos como Inovação Tecnológica, Empreendedorismo e Conhecimento. Esta constatação de que a história importa (que as capacidades das empresas são idiossincráticas e não abstratas como nos modelos microeconómicos), que a tecnologia é fundamental para o crescimento (como previam Schumpeter, Arrow e Nelson), que os agentes económicos dificilmente são racionais, abalou 5 anos de modelização e matematização económica. O modelo de inovação da hélice tripla refere-se a um conjunto de interações entre academia, indústria e governos para promover o desenvolvimento económico e social. Este conceito (entre muitos outros da “economia da inovação”) acabou por moldar de uma forma muito prática o crescimento dos EUA, com as ligações de universidades, como o MIT, a grandes empresas como a Google e a Apple, entre milhares de outras, e as políticas (sobretudo estatais) a demonstrarem o seu potencial. Na Europa, a abordagem foi muito mais institucional, mas o empresário e gestores de PME certamente ouviram falar das RIS3 e dos SI Inovação e de muitas outras políticas que foram desenhadas a pensar nesta tripla ligação sistémica. Mas 17 anos de ciência aliada a uma perspetiva mais prática permitiram perceber que nem sempre esta hélice está oleada. Universidades e politécnicos perdem-se no seu interior opaco e burocrático sem perceber a linguagem da indústria, empresários perdem-se em esquemas para financiar máquinas em vez de apostar em inovação e entidades de política centram-se na forma de maximizar reeleições. Esta trindade é fundamental em qualquer país, mas sem uma verdadeira compreensão para além da miopia, a hélice apenas produz vento vazio.

Crónica publicada no Jornal de Leiria