Crónicas de Gestão | O FIM DO EMPREGO III

Vitor Ferreira

Diretor Executivo da D. Dinis, Business School

 

Uma das consequências da automação e da substituição de trabalhadores em tarefas cada vez mais sofisticadas revela-se no facto de que, na maioria do mundo ocidental, o salário do trabalhador médio, ajustado ao custo de vida, está estagnado. Nos EUA, o salário real quase não se alterou ao longo das últimas quatro décadas e, mesmo em lugares como o Reino Unido e na Alemanha, onde o desemprego é extremamente baixo, os salários têm estagnado na última década. Recentes investigações sugerem que isso acontece porque a substituição de capital para o trabalho através da automação é cada vez mais atraente; como resultado os proprietários de capital têm capturado uma parcela cada vez maior do rendimento desde a década de 1980.

Mesmo em países relativamente igualitários como a Suécia, a desigualdade entre os empregados aumentou consideravelmente. Trabalhadores cujas competências sejam complementares ou essenciais para a progressão da automação e “computerização” da economia têm visto o seu salário aumentar, enquanto todos aqueles cujas tarefas sejam relativamente repetitivas ou padronizadas têm visto os seus salários estagnar (quando o seu posto de trabalho não desaparece mesmo). Um artigo de 2013 de dois autores (Frey e Osborne) indica que 47% dos empregos poderão ser vítimas da automação nos próximos 20 anos (desde o caso dos condutores profissionais, que já aqui discutimos, até ao caso do setor dos contabilistas e auditores, cujos autores consideram ser 99% provável que venha a perder empregos).

Já discutimos nestas crónicas algumas implicações desta progressão, desde a necessidade de reformular sistemas de ensino (fomentando formações mais criativas e abrangentes) até à necessidade de criação de mecanismos sociais de ajustamento (reconhecendo que o progresso técnico e inovação são, per se, positivos, sendo que são os desajustamentos socioeconómicos que causam que têm de ser geridos). Esta é uma discussão tão mais relevante num contexto em que se fala de sustentabilidade do sistema de segurança social (que tem de ter em conta esta nova realidade mundial), ou de negociação de tratados internacionais de comércio (fortemente marcados pelo reconhecimento de que a propriedade intelectual é chave da riqueza num futuro próximo). Contudo, na espuma dos dias, a única sonora discussão sobre emprego que registamos envolve treinadores e clubes de futebol, dando razão a Huxley, que seremos vítimas das nossas cegas paixões.