Segundo estudos históricos, a linguagem escrita (não a numérica) foi inventada de forma independente em 3 lugares distintos e em 3 distintos momentos do tempo – no Médio Oriente (Mesopotâmia e Egipto, 3200 a.C.), na China (1200 a.C.) e na América Central (pelos Olmecas cerca de 600 a.C.), sendo que alguns historiadores argumentam uma quarta emergência da escrita no vale do Indostão. Antes da emergência destes sistemas, existem registos daquilo que os historiadores definiram como proto-linguagens, mas que seriam menos completas e complexas.
Na verdade, todos os alfabetos modernos são derivações destas primeiras construções que emergiram nestes locais. A escrita permitiu que as sociedades transmitissem informações e compartilhassem conhecimentos. O maior benefício da escrita é que ela fornece a ferramenta através da qual a sociedade pode gravar informações de forma consistente e com maior detalhe, algo que não poderia ser alcançado de forma perfeita pela palavra falada. Mas na sua génese, estes sistemas resultam de necessidades económicas básicas de coordenação, controlo da propriedade e da necessidade de diminuição dos custos de transação, através da criação de normas, regras e registros. Os sistemas de escrita derivaram da existência de sistemas de inventários, da necessidade de registrar transações e da necessidade de criar regulamentos e regras para orientar a vida em sociedade (de uma espécie humana que havia transitado da recoleção/caça para a sedentarização agrícola).
Estes sistemas ajudaram a resolver problemas de cooperação em ambientes muito diversos, como os das cidades, que transcendiam os limites da cognição humana. Os sistemas de escrita e de inventário permitiam acompanhar interações heterogéneas numa escala sem precedentes e armazenar a informação para guiar comportamentos futuros (tratar situações iguais de forma recíproca). Em segundo lugar, estes sistemas facilitaram a formação de reputação, fornecendo um registro do comportamento passado (crimes, transações, decisões, etc.). Em terceiro lugar, promoveram a construção, transmissão e manutenção de normas sociais e punições morais. Finalmente, os sistemas alfabetizados ajudaram a construir empatia para com os outros (no passado e em outros locais), tornando mais acessíveis as perspetivas de quem normalmente não interage diretamente. No fundo, se hoje o leitor está ler estas linhas deve-o provavelmente (e hiperbolicamente) à necessidade remota de registar uma troca de um carneiro por um alqueire de trigo.
Crónica de Gestão publicada na edição de 17 de dezembro de 2015 no Jornal de Leiria